Só não se perca ao entrar no meu infinito particular...

Só não se perca ao entrar no meu infinito particular...

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

"É assim: vezenquando, uma coisa só começa mesmo a existir quando você também começa a prestar atenção na existência dela. Quando a gente começa a gostar duma pessoa, é bem assim."
"Principalmente às sextas-feiras, pouco antes de desabarem sobre mim aqueles sábados e domingos(. . .) alguém diria telefone-para-você e do outro lado da linha aquela voz conhecida diria sinto-falta-quero-voltar. Isso nunca aconteceu..."

terça-feira, 3 de fevereiro de 2009

Quando a noite chegar cedo e a neve cobrir as ruas, ficarei o dia inteiro na cama pensando em dormir com você.
Quando estiver muito quente, me dará uma moleza de balançar devagarzinho na rede pensando em dormir com você.
Vou te escrever carta e não te mandar.
Vou tentar recompor teu rosto sem conseguir.
Vou ver Júpiter e me lembrar de você.
Vou ver Saturno e me lembrar de você.
Daqui a vinte anos voltarão a se encontrar.
O tempo não existe.
O tempo existe, sim, e devora.
Vou procurar teu cheiro no corpo de outra mulher. Sem encontrar, porque terei esquecido. Alfazema?
Alecrim. Quando eu olhar a noite enorme do Equador, pensarei se tudo isso foi um encontro ou uma despedida.
E que uma palavra ou um gesto, seu ou meu, seria suficiente para modificar nossos roteiros.

(Silêncio)


"Então caminhava quilômetros na beira do mar, me rolava na areia, vez enquando chorava e repetia: pequeno monstro, pequeno monstro, ninguém te quer."
"Alguma coisa em mim - e pode-se chamar isso de 'amadurecimento' ou 'encaretamento' ou até mesmo 'desilusão' ou 'emburrecimento' - simplesmente andou, entendeu? Desisti de achar que o príncipe vai achar o sapatinho (ou sapatão) que perdi nas escadarias. Não sinto mais impulsos amorosos. Posso sentir impulsos afetivos, ou eróticos - mas amorosos, sinceramente, há muito tempo. É estranho, e não me parece falso, mas ao contrário: normal. Era assim que deveria ter sido desde sempre. E não se trata de evitar a dor, é que esse tipo de dor é inútil, é burra, é apego à matéria."
"Eu prefiro viver a ilusão do quase, quando estou 'quase' certa que desistindo naquele momento vou levar comigo uma coisa bonita. Quando eu 'quase' tenho certeza que insistir naquilo vai me fazer sofrer, que insistir em algo ou alguém pode não terminar da melhor maneira, que pode não ser do jeito que eu queria que fosse, eu jogo tudo pro alto, sem arrependimentos futuros! Eu prefiro viver com a incerteza de poder ter dado certo, que com a certeza de ter acabado em dor. Talvez loucura, medo, eu diria covardia, loucura quem sabe!"
Não sei, até hoje não sei
se o príncipe era um deles.
Eu não podia saber, ele não falava.
E, depois, ele não veio mais.
Eu dava um cavalo branco para ele,
uma espada, dava um castelo e
bruxas para ele matar, dava todas
essas coisas e mais as que ele pedisse,
fazia com a areia, com o sal,
com as folhas dos coqueiros,
com as cascas dos cocos,
até com a minha carne eu construía
um cavalo branco para aquele príncipe.
Mas ele não queria, acho que ele não queria,
e eu não tive tempo de dizer que
quando a gente precisa que
alguém fique a gente constrói
qualquer coisa, até um castelo. 


Caio Fernando Abreu,
Inventário do ir-remediável.