19 DE NOVEMBRO DE 1926
É quase um milagre-a tua discrição-,uma carta dentro de outra. Dar-te-ei uma resposta assim qu e te vir_no que diz respeito ao convite-, entenda-se. Sibyl fez-me tantas dores de cabeça, Deus meu!E como é aborrecido eu não ser capaz de queixar-me senão a ti. Estou pregada numa poltrona. Mas não é nada grave:se to digo, é apenas para que te compadeças de mim, para invocar tua proteção, para te implorar que inventes um meio qualquer de impedir as pessoas de debicar na mina vida:Sir Arthue, Dadie um logo a seguir o outro. Por que será que eu tenho sempre de infligir-te isto a ti?. Trata-se sem dúvida, de uma necessidade de ordem psicológica: uma dessas coisas ditadas pelo instinto, no decorrer de uma relação íntima. Esta dor que eu tenho nas costas tira-me toda a minha coragem; se estivestes no meu lugar, sei que serias heróica. Mas também não sinto o menor desejo de passar o resto de minha existência em Rodmell com Mrs. Bartholomew (a mulher a dias), ao pé de mim.
É uma mulher mundana, essa Sibyl Colefax, de uma espécie que me é, por assim dizer, desconhecida. Os nossos valores são diferentes. A amizade, sem falar de intimidade, são impossíveis. Apesar disso, eu respeito-a, admiro-a, até. Não deixei um só instante de perguntar amim própria por que é que ela teria vindo: parecia-me tão pouco à vontade, embora mantendo-se totalmente indiferente, indício revelador de que nunca lhe dizem a verdade. Tudo tocou de passagem, sofismando, minimizando as coisas, constantemente transigindo; e, no entanto, no fundo, ela é boa e generosa. É curioso que alguém como eu, tão dotado para a intimidade, acabe por ficar completamente desconcertado.
O que tu não queres compreender, mulazinha de West que tu és, é que um dia te cansaras de mim (afinal, sou muitíssimo mais velha do que tu) e que, desde já, me é necessário tomar algumas pequenas precauções; é efetivamente por isso que prefiro, a partir de agora, principiar a estabelecer as minhas recordações, em vez de viver apenas o momento presente. Mas a mina mulazinha de West certamente sabe que, mais do que ninguém, fez ruir as minhas defesas. Não há, dentro de ti, algo indefinido? Não sei, qualquer coisa em ti, uma vibração que não se produz? Pode ser que seja um ato de vontade, porque tú nunca te abandonas; sempre o constatei quando estás comigo; qualquer coisa de secreto, de som abafado, Deus sabe o que tal poderá ser. E, no entanto, pensa nesse 19 de novembro e compara ao do ano passado: tens de admitir que há uma diferença. Isso vê-se também no escreves, seja dito de passagem. Aquilo que eu chamo atransparencia central falta, por vezes, em ti. Farei um sermão sobre este assunto em Long Barn ... O meu problema é que, minha anatomia, há uns tantos centímetros, mesmo no cimo, que são particularmente e terrivelmente sensíveis. Querida mulazinha de West, virás à Hogarth, as 14h 30m, realmente? ... Como será doce: estender-me-ei no sofá, e far-me-ei amimar por ti. A dor já quase me passou. A Irene foi mais carinhosa do que eu? Deixa-me dizer-te algo algo espantoso. Dei comigo a pensar na morte com uma curiosidade intensa. E, todavia, se há uma coisa de que eu tenha a certeza, é de que somos mortais. Mas, então, por que ter esta impressão de que a morte será algo de... apaixonante, de positivo, de ativo?
Tua V.W.
P.S.
Chegaram as tuas flores;elas são como tú, adoráveis, crepusculares, torturadas, apaixonadas. Acabei de tomar o pequeno almoço, e sinto-me muito melhor; depois reli a minha carta, e tive vergonha de tanto egoismo: quase que sinto vontade de rasgá-la, mas já não tenho tempo de escrever outra. E o sermão que te prego nõa é gentil. Mas, também, eis ao que se arriscam aqueles que vêm atacar esta pobre Virgínia, e Grizzle. Mordem imediatamente.
Um comentário:
Cara Mariana, parabéns por sua postagem, eu tenho o livro "Cartas intimas à Vita Sackville", no qual tem a carta que mencionasse.
Gosto muito da história de Vita, e também tenho os diários de Virgínia.
Abraços Luciane.
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